A interação entre clima e agricultura é intrínseca e complexa, sendo um ponto de atenção para a produtividade agrícola, especialmente em períodos com influência do fenômeno El Niño. No Brasil, um país com uma vasta extensão territorial, os fenômenos climáticos podem ter impactos variados. Eles influenciam não só o crescimento das culturas, mas também o manejo agrícola, incluindo o controle de pragas e doenças.

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Fonte: Mais Agro, 2023.

O El Niño é um exemplo marcante da interação entre clima e produtividade agrícola. Caracterizado pelo aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico, o fenômeno pode alterar padrões climáticos globais. No Brasil, seus efeitos podem variar de acordo com a região:

  • Sul e Sudeste: essas regiões podem experimentar chuvas mais intensas por conta dos efeitos do El Niño, afetando culturas sensíveis ao excesso de água e aumentando o risco de doenças fúngicas.
  • Centro-Oeste e Norte: pode ocorrer um aumento nas temperaturas e uma redução nas chuvas, impactando culturas como soja e milho, que são sensíveis à falta de água durante fases críticas de desenvolvimento.
  • Nordeste: essa região pode enfrentar períodos de seca prolongada, afetando culturas como o algodão e a cana-de-açúcar, bem como a pecuária.

É essencial para os produtores rurais estarem cientes dessas variações climáticas e se prepararem para possíveis mudanças, adotando práticas de manejo adaptativas, como a escolha de cultivares resistentes ou a alteração do calendário de plantio.

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O que é o El Niño e como ele se forma?

O El Niño é um fenômeno climático caracterizado pelo aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico equatorial, que influencia padrões climáticos em várias partes do mundo. No Brasil, seu estabelecimento pode gerar alterações significativas no regime de chuvas e temperaturas.

Em outubro de 2023, o fenômeno El Niño mostrou intensidade moderada, com previsões indicando que pode influenciar o clima brasileiro durante novembro e dezembro de 2023 e persistir no primeiro semestre de 2024. 

O NOAA (National Weather Service), um órgão oficial dos Estados Unidos, monitora constantemente o ENSO (El Niño Southern Oscilation), que é o índice determinante da intensidade e da duração do fenômeno. Segundo o relatório de outubro de 2023, a previsão é de que o El Niño continue durante a primavera do Hemisfério Norte, com uma probabilidade de 80% entre março e maio de 2024.  

Na prática, isso significa que as chances do fenômeno se manter são altas, com ainda mais intensidade e ampliando sua influência, visto que a SST (temperatura da superfície do mar) atingiu 2.3 ºC, configurando um El Niño com grandes chances de atingir alta intensidade.

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Cada gráfico representa uma região do Oceano Pacífico, sendo a Niño 1+2  referente à costa da América do Sul. A linha central representa uma condição de neutralidade do fenômeno climático, as curvas abaixo determinam o grau de intensidade do La Niña e as curvas acima determinam o grau de intensidade do El Niño. Fonte: ENSO: Recent Evolution, Current Status and Predictions, outubro, 2023.

Como o El Niño impacta a agricultura brasileira?

A última vez em que vivenciamos um El Niño de alta intensidade foi em 2016, quando o clima impactou drasticamente a agricultura brasileira, alterando os padrões climáticos e consequentemente afetando a produção agrícola em diferentes regiões do país. 

Naquele ano, as regiões Sul e Sudeste experimentaram chuvas acima da média, resultando em enchentes e prejudicando culturas como soja e milho. O excesso de umidade também favoreceu a proliferação de pragas e doenças. De fato, a safra de soja 2015/16 teve uma das piores produtividades da série histórica, de acordo com os dados da Conab: 2.878 t/ha, contra 3.392 da safra seguinte.

No Centro-Oeste, o El Niño de 2016 resultou em um período de seca, impactando negativamente culturas que dependem de um regime de chuvas regular, como a soja e o algodão. Na série histórica da Conab, a produtividade da pluma em 2015/16 foi 10,9% inferior em relação à safra anterior. 

Já as regiões Norte e Nordeste sofreram com secas severas, afetando a agricultura de subsistência e a pecuária e reduzindo significativamente a produtividade e a qualidade dos produtos. Com esses exemplos, é possível entender que o El Niño não é bom sinal para a agricultura. 

Apesar de as últimas três safras terem sido influenciadas negativamente pelo La Niña, causando perdas principalmente no Sul do Brasil, um El Niño intenso em 2024 pode vir a ser ainda mais negativo. 

Essas mudanças climáticas exigem dos agricultores uma adaptação contínua e a implementação de práticas de manejo mais resilientes para mitigar os impactos negativos sobre a agricultura. A saída é manter-se informado e tomar medidas preventivas para proteger as lavouras das interferências climáticas, com uso de tecnologias aplicadas aos cultivos. 

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No Norte, espera-se que o El Niño ocasione um regime de chuvas acima da média, o que pode dificultar o manejo de culturas e o uso de maquinários no campo. No Nordeste, por outro lado, o fenômeno pode causar secas prolongadas, afetando a agricultura de subsistência e a produção de culturas como o algodão.

Já no Centro-Oeste, as chuvas irregulares prejudicam o cultivo de soja e milho. No Sudeste, o El Niño tende a provocar chuvas intensas, o que pode favorecer o aparecimento de doenças em culturas como o café. Por fim, no Sul, o fenômeno pode causar estiagens, impactando culturas como o trigo e a soja.

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Soja

O Monitoramento das Condições das Lavouras de 23 de outubro indica que o El Niño está influenciando o andamento do plantio de soja no Mato Grosso, visto que as operações foram suspensas pela combinação de falta de chuvas e temperaturas elevadas. Apesar disso, com 28,4% das lavouras semeadas, as condições das plantas em desenvolvimento são boas. Algo parecido se verifica em Goiás, com algumas áreas necessitando de replantio.

O clima também atrapalha a semeadura no Rio Grande do Sul, desta vez, pelo excesso de chuvas. O solo encharcado impede que as máquinas trafeguem no campo e atrapalha o estabelecimento e o desenvolvimento das lavouras já instaladas, que apresentam condições regulares, o mesmo se verifica em Santa Catarina. 

Em São Paulo, o plantio está em atraso pelo excesso de umidade. A irregularidade pluviométrica em Minas Gerais vem interrompendo as operações de plantio, enquanto no Tocantins o mesmo ocorre devido à seca.

Apenas em Mato Grosso do Sul e na Bahia o avanço do plantio da soja não sofre com as interferências climáticas, o primeiro por conta das boas condições do clima, e o segundo porque as lavouras irrigadas não dependem do clima para se desenvolver.

Caso o cenário não se normalize em breve, é possível que a safra de soja 2023/24 tenha que lidar com alguns dos seguintes fatores:

  • Redução do potencial produtivo: o atraso pode resultar em menor produtividade devido à redução do período de crescimento e desenvolvimento da planta.
  • Problemas de qualidade do grão: plantios tardios podem levar à maturação da soja em condições climáticas menos favoráveis, afetando a qualidade do grão.
  • Aumento de pragas e doenças: o atraso no plantio pode coincidir com períodos de maior incidência de pragas e doenças, exigindo mais controle e aumentando os custos.
  • Desafios na gestão do solo: o atraso pode afetar a rotatividade das culturas de segunda safra e a gestão da fertilidade do solo, potencialmente diminuindo a eficácia do uso de nutrientes.
  • Impacto na janela de plantio das culturas de segunda safra: o atraso na semeadura pode impactar diretamente na janela de plantio para culturas como milho segunda safra e algodão.
  • Impacto na janela de comercialização: o atraso pode afetar o período de colheita e venda, impactando o valor recebido pelo produtor.
  • Dificuldades logísticas: a colheita pode coincidir com épocas de chuva, dificultando a logística e o transporte da produção.

Diante disso, os sojicultores devem ficar atentos ao clima, à dinâmica do mercado e ao monitoramento das lavouras, para poder gerenciar esses desafios da melhor forma possível. 

Apesar disso tudo, é possível que o El Niño não se intensifique e as mudanças climáticas não surtam maiores efeitos, sendo possível concretizar as estimativas da USDA de uma produção de 163 milhões de toneladas de soja colhidas pelo Brasil em 2024. 

Milho

Tanto o milho verão quanto o milho safrinha podem ser afetados pelo El Niño. A Conab indica que 33% da área destinada à primeira safra já estava semeada em 23 de outubro. 

Em Minas Gerais, a atividade de plantio está primariamente focada em áreas com sistema de irrigação. No Rio Grande do Sul, as plantações estão mostrando um crescimento saudável, com as primeiras áreas plantadas já entrando na fase reprodutiva. Contudo, em certos locais, a acumulação de água resultou em falhas no estande e dificultou a execução de práticas culturais essenciais. 

No Paraná, o processo de plantio está quase finalizado, e a maioria das áreas apresenta um desenvolvimento favorável. No entanto, chuvas excessivas têm causado erosão, falhas na germinação e interferido nas práticas culturais. 

Em Santa Catarina, o excesso de chuvas tem complicado tanto a semeadura quanto a realização de tratamentos culturais, resultando em condições variadas das lavouras, de boas a regulares. Em São Paulo, o ritmo de plantio permanece lento devido às precipitações frequentes e abundantes.

No que tange à safrinha, no Centro-Oeste, a irregularidade das chuvas pode ser prejudicial, enquanto no Sul, períodos de seca podem afetar negativamente a produção a partir de abril de 2024.

Cana-de-açúcar

No Centro-Sul, região em que se concentra a produção de cana-de-açúcar, o El Niño pode causar estiagens ou chuvas irregulares, ambas prejudiciais à cultura. Essas condições podem impactar não apenas a quantidade, mas também a qualidade da produção, afetando o mercado de açúcar e etanol.

Em outubro de 2023, a safra 2023/24 de cana-de-açúcar no Brasil enfrenta desafios significativos devido a fatores climáticos. As condições meteorológicas adversas, como períodos de seca prolongados em algumas regiões e excesso de chuvas em outras, têm impactado tanto a qualidade quanto a quantidade da cana-de-açúcar.

  • Regiões secas: em áreas afetadas pela seca, a moagem de cana-de-açúcar tem sido dificultada pela baixa umidade do solo, resultando em cana de menor qualidade e, consequentemente, em menor produção de açúcar e etanol.
  • Regiões com chuvas excessivas: em contrapartida, regiões com excesso de chuvas enfrentam atrasos na colheita devido às condições inadequadas do solo, o que prejudica a eficiência da moagem e pode levar à deterioração da cana.
  • Impacto na produção: globalmente, esses fatores climáticos resultam em uma redução na produção total, afetando tanto o mercado interno quanto as exportações.
  • Estratégias de adaptação: os produtores estão buscando estratégias de adaptação, como o investimento em variedades de cana mais resistentes e o aprimoramento dos sistemas de irrigação, para minimizar os impactos negativos do clima na safra.

Portanto, o clima continua sendo um fator crítico que desafia a moagem de cana-de-açúcar na safra 2023/24, exigindo medidas adaptativas e proativas para garantir sustentabilidade e eficiência da produção.

Trigo

O trigo encontra-se em fase de colheita, com 59,2% das áreas já colhidas. No Rio Grande do Sul, as chuvas impactaram negativamente a velocidade da colheita, causando germinação precoce nas espigas de lavouras maduras. A produtividade foi comprometida devido à prevalência de doenças na fase final do ciclo, levando a uma redução no pH dos grãos nas lavouras colhidas.

No Paraná, aproximadamente 80% das lavouras foram colhidas. Entretanto, períodos chuvosos interromperam a colheita e afetaram negativamente a qualidade de algumas lavouras. Em São Paulo, a colheita foi concluída, com as lavouras mais tardias exibindo qualidade superior.

Em Santa Catarina, a instabilidade climática influenciou o progresso da colheita, diminuindo a qualidade tanto das lavouras quanto dos grãos. Além disso, doenças no final do ciclo reduziram o potencial produtivo dos estandes que estão no início da maturação.

Café

O café, uma das culturas mais sensíveis às variações climáticas, pode ser fortemente impactado. No Sudeste, especialmente em Minas Gerais e São Paulo, chuvas intensas e irregulares podem prejudicar a florada e a formação dos grãos, afetando tanto a produtividade quanto a qualidade.

Algodão

O algodão pode ter sua produção afetada pelas variações climáticas causadas pelo El Niño. Secas ou chuvas excessivas podem não apenas reduzir a produtividade, mas também afetar a qualidade das fibras.

O El Niño é um fenômeno complexo e de grande relevância para a agricultura brasileira. Seu impacto varia de acordo com a região e a cultura, sendo essencial um monitoramento constante e uma gestão de risco eficaz para minimizar seus efeitos negativos. Compreender e se adaptar às mudanças climáticas é um desafio, mas também uma oportunidade para fortalecer a resiliência e a sustentabilidade da agricultura no Brasil.

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